No próximo dia 5 de maio comemora-se o Dia Mundial da Língua Portuguesa, uma data instituída pela UNESCO, que nos convida a recordar e a enaltecer o papel fundamental da língua portuguesa enquanto instrumento de comunicação global, de expressão cultural e de promoção do conhecimento.
Falada por mais de 260 milhões de pessoas nos cinco continentes, a língua portuguesa une comunidades e é ponto de encontro global para o entendimento e partilha entre alunos e escolas de diversas regiões e culturas.
Para celebrar este dia tão especial, a Escola Amiga da Criança vai homenagear a língua portuguesa com a partilha de um poema de João Pedro Mésseder que partilhamos, de seguida.
Língua Portuguesa, O Dia Mundial
Uma língua traz-nos no ventre muitos séculos. Nos últimos nove meses, os da gestação, começamos a escutar o seu timbre, o seu ritmo, a sua métrica. Sem darmos conta, a língua alimenta-nos, agasalha-nos, estamos nela mergulhados, na sua água, no seu calor.
Um dia essa língua dá-nos à luz. Logo a seguir conforta-nos, beija-nos, para adormecermos embala-nos com uma canção. Quanto mais a língua nos brinca e nós brincamos com ela, quanto mais nos canta e nos conta, mais entra aos poucos, sempre um pouco mais, no mais dentro de nós. Começa a viajar-nos a língua e a confundir os sons dela com os nossos.
Em nós está ela já, impossível desinstalá-la. As primeiras palavras nos dizem dizendo o mundo, aquele que somos e o outro: mãe e pai, bebé e casa, e papa e água e pão, e sujo e terra e gato…. Quanto mais crescemos mais nos dizemos, e dizemos as coisas com mais e mais palavras. Algumas no início atraem-nos: leite e açúcar, água e brinquedo, menino e jogar, correr, tomar banho, e flor e árvore e areia…. Crescemos na língua à medida que a língua cresce por dentro de nós. Há uma emoção que adolesce na palavra; a palavra emociona. Aprende-se devagar a fixar na escrita tais sentires, a capturar as coisas palavrando.
Agora o mundo organiza-se também em breves construções ordenadas de palavras a que chamamos histórias ou cantigas ou mesmo poemas. Elas contam-nos e nós contamo-nos e contamos os outros. Cada vez mais as palavras traduzem a inteligibilidade do mundo, e também as feridas, o caos, as cicatrizes. Há palavras que nos atraem, mas outras há que nos traem.
Da língua materna e maternal que afinal nos habita – ou somos nós que já a habitamos ou as duas coisas? –, dessa portuguesa língua, além de filhos, nos tornamos um pouco mestres e amos, estamos prontos a viajar com ela e a nela viajar, prontos a deixá-la ganhar pátria e ganhar mundo. Na língua nossa amamos, nela chegamos aos outros que a nós chegam, com ela fazemos a paz, também a guerra. E às vezes magoamo-la, violentamo-la. Além disso, a língua portuguesa já não é apenas nossa mãe, nem nós apenas seus filhos. Somos carne da sua carne e ela carne nossa. Estamos talvez preparados para dar à luz. Para sermos mãe. Na Europa, em África ou nas Américas, na Oceânia, na Ásia, em qualquer lugar.
Minha língua é minha mátria. Minha pátria é minha língua, dizia Caetano Veloso dizendo Pessoa a dizer-se…
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